junho 30, 2010




Das Marias











As Praças, Generoso Marques e Borges de Macedo, que abraçadas ao belo Palacete de Cândido de Abreu formam o Paço da Liberdade, sempre foram reduto das moças que vendem o corpo ou serviços para agradar o corpo de alguém, por uns trocos. Barato, bem barato, elas oferecem seus serviços nas imediações de bares e cines pornôs.
Uma época, em 93/94, fiz uma pesquisa e documentação da área para a Fundação Roberto Marinho e Ippuc, quando conheci muitas delas que até hoje estão na ativa. Na época, muitas gostavam de falar e serem fotografadas. Hoje, mais ariscas, não dão muito papo e eu também, com o tempo, estou cada vez menos invasiva. A decana de todas, que num domingo tentei, pela ultima vez levar papo nessa temporada, lembra-se de mim. Diz que então eu era muito atrevida. Uns caras do "graxaim", um boteco na galeria do e cine pornô,  queriam até me pegar - que meda! -, depois que entrei lá e fotografei.
Eram umas fotos bem no contra-luz, eu não ia dedurar ninguém. Elas, me contou a loira que continua não querendo intimidade quando não responde ao meu cumprimento, falaram que eu só fotografava telhado e paredes. Achavam até que eu nem era normal. Foi o que disse um outro fotógrafo quando pedi a ele para voltar comigo lá. Você enlouqueceu, perguntou ele. Nunca leu a Tribuna? Aquele espaço é barra pesadíssima.
Depois disso, por questão de respeito, nunca mais entrei lá. Não é mesmo mais fotogênico. Tiraram o antigo neon, trocaram o piso e iluminaram bem a galeria, antigamente escura. O bar continua mas a portas fechadas. As "moças" continuam a trabalhar no Paço, hoje em dia, em menos e com representantes de umas três gerações. Não atrapalham. Servem, eu já ouvi várias negociações, que é claro não fotografava, quanto às modalidades e tabela. Muito baratos, eu me lembro, e ousadíssimos, os itens do cardápio. Tudo que possa parecer criatividade ou loucura da hora, já foi testado e aprovado no mundo da gandalha. A maioria dos fregueses, velhos, muito velhos. Gente simples que foi receber a aposentadoria e aproveitou pra fazer uma travessura. Coisas que nem sonha pedir à inha lá em casa. Portanto, têm uma grande função social, essas prostitutas da 'melhor idade'. Clientes, isso me contaram elas, de décadas. Uma vez por mês, gastam entre dez e trinta reais, por uns minutos de fantasia. Penso que nunca tirarão essas senhoras de lá. Já foram tombadas, pelo menos por mim, como mobiliário urbano do Paço. Com todo respeito, estão fazendo o que fazem há anos, sem incomodar ninguém.
Questão de  usucapião.

 



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Quem sou eu

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Curitiba, Paraná, Brazil
Sou fotógrafa e curiosa. Vivo na cidade de Curitiba e gosto de olhar e documentar a relação das pessoas com os espaços em geral. Levo isso ao pé da letra, quando fotografo as ruas e sua ocupação desordenada. Também nos interiores das submoradias, longe de qualquer padrão de ordem mas com um sentido de segurança, mesmo que penduradas e vulneráveis à primeira chuva. Mas tudo isso tendo como compromisso a beleza, a harmonia. Mesmo na realidade de uma favela, resgatar a dignidade através do belo é o que me interessa. Gosto também, e muito, de design e arquitetura. Da social à contemporânea, o gosto pelo ocupar me interessa. contato: linafaria@yahoo.com.br
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