junho 16, 2010


















                                                                         





          O Hábito faz o monge?








Rolou um papo brabo aqui no point dos desvalidos e destemidos.
Quando eu voltava do almoço e passava pela calçada onde há uma lanchonete cuja atendente me informa se o "Grandão", como ela própria o batizou, já comeu ou não, a encontrei com um ar preocupado.
Ela meio que administra uma conta corrente dos comerciários, funcionários públicos, músicos, enfim, a pequena comunidade - que não se conversa mas se conhece - , num pequeno fundo alimento em proteção a esse ser doente que anda como um zumbi. Ou bêbado, ou dormindo nas calçadas. 
Ele é do bem. Tenta trabalhar e alguns até utilizam de seus préstimos enquanto está sóbrio. Coisa rara.


Bem, mas a moça quando me viu chamou-me e disse que rolou um boato sobre o Grandão ter sido levado pela FAS já desfalecido. Isso teria acontecido na noite de sábado.
Fiquei, se por um lado preocupada, por outro aliviada de alguém ter conseguido retirá-lo da rua para que possa ser tratado. Está bem prejudicado.
A FAS que falo é a Fundação de Ação Social, orgão municipal que resgata o pessoal de rua. Só que por lei os agentes sociais não podem exigir que a pessoa vá. A maioria não quer ser resgatada pelo sistema por vários motivos. Estatisticamente não há retorno, readaptação à vida dita normal.
Voltando ao caso do moço de pés enfermos, ultimamente o rosto também bem ferido, fiquei triste. Tenho enfrentado algumas perdas, testemunhado fatos dramáticos e confesso que fiquei extremamente chateada.


Hoje, como ontem logo cedo, estava no ponto deles apenas um antigo usuário. O Cheirosinho, como o chamam os cabeleireiros, senhor de idade que ronda por ali há anos. Já esperava que tivessem mesmo "guardado"o cara. Nem Baixinho, nem Grandão.
Depois, soube da especulação da garçonete, pronto. Melhor esquecer, quiçá arquivar a sequência de acontecimentos que registrei do tempo de convívio da dupla ali naquele não-espaço. Logo outros viriam.


Quando começaram os fogos e a mobilização da rua para o jogo, fotografei alguma coisa, inclusive um chapéu caído na calçada.


Rotina meio de feriado, quando volto à sacada pra conferir a evolução dos fatos, em meio a urros de vuvuzelas, eis que surge quem? quem? O Grandão. Banho tomado, roupa nova, todo estiloso, usava até uma cartola verde e amarela, aquela que eu fotografara caída na calçada. A cartola lhe dava um ar dandy, além de lhe esconder o ferimento do rosto, fazendo-lhe mudar até a postura. Estava visivelmente restaurado. Com a auto estima em dia.
Que bom, pensei. Quem o levou foram os Franciscanos, anjos quase invisíveis que cuidam dessa clientela.
Levam -os para uma casa onde cuidam das feridas, oferecem banho, comida e nada pedem em troca.
Quando melhores, podem ir se quiserem ou serem encaminhados a algum programa oficial de desentoxicação que provavelmente não seja nenhum spa. Todos fogem disso como o diabo da cruz.


Então nosso herói, mais uma vez, dá a volta por cima. Logo descerá, se não já, ao érebo de sua cruel rotina. Já acostumou-se com isso.












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Curitiba, Paraná, Brazil
Sou fotógrafa e curiosa. Vivo na cidade de Curitiba e gosto de olhar e documentar a relação das pessoas com os espaços em geral. Levo isso ao pé da letra, quando fotografo as ruas e sua ocupação desordenada. Também nos interiores das submoradias, longe de qualquer padrão de ordem mas com um sentido de segurança, mesmo que penduradas e vulneráveis à primeira chuva. Mas tudo isso tendo como compromisso a beleza, a harmonia. Mesmo na realidade de uma favela, resgatar a dignidade através do belo é o que me interessa. Gosto também, e muito, de design e arquitetura. Da social à contemporânea, o gosto pelo ocupar me interessa. contato: linafaria@yahoo.com.br
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