O PALHAÇO CAÇÚ
Durante dez anos da minha vida passei horas diárias dentro desse caixotão modernista que acolheu, desde Bento Munhoz da Rocha, seu idealizador, o Poder Executivo do Estado do Paraná.
Não era pouco mas eu não tinha noção do meu privilégio em acessar espaços insondáveis. Ou tinha mas não estimava a questão organização e acabei perdendo pelo caminho grande parte de minha produção fotográfica. Inclusive as feitas ali à bordo daquele "navio cidade" que era a sede do poder. Via-o assim. Um grande navio com cozinha, capela, pároco, onde eu era, com minha curiosidade e facilidade de comunicar-me, uma espécie de rato com crachá, circulando desde os porões, becos e passagens secretas, ao gabinete do governador. Estou fantasiando um pouco quanto às passagens secretas, mas havia sim no segundo andar, entre a sala dos fotógrafos e o gabinete, uma passagem entre prateleiras com pratarias, porcelanas, rouparia, todo o enxoval do palácio, que nos facilitava o acesso, quando urgente, à "sala do chefe", o governador, na época Nei Braga. Sim, isso faz tempo. Após a vinda do Papa João Paulo II, em 1980, a então Subchefia de Comunicação Social passou a funcionar num anexo e a fotografia foi lá para o pátio, onde se construiu uma infra maior para receber a imprensa internacional, e funciona até hoje ocupado pela fotografia. Mesmo assim passávamos muito tempo na sede.
História comprida para contar meu apego ao espaço. Tive minhas duas filhas enquanto trabalhava ali, viajando todo o Paraná, durante essa década, ainda colaborando para a imprensa nacional. Tempos de muita produção, trabalho duro, mesmo.
Bem, após anos "fechado para reforma", o Palácio passa a ser restaurado, deixando sua carcáça exposta.
Não sei se aos outros, mas a mim causa um espanto, um impacto, um mal estar mesmo em vê-lo assim tão vulnerável, com sua víceras à vista. Essas denunciam os maus tratos pelos seus ocupantes durante as décadas e várias gestões de ocupação. Quando desocupado, consegui fotografá-lo vazio, o que já me deixou melancólica. Agora, depois de meses de restauro, fotografei-o outro dia, de fora, mas todo vazado, todo à mostra. No ângulo frontal, da elevação, parece uma casa de bonecas, com o corte mostrando as divisões.
Ah, porque Palhaço Caçú? Porque a Aninha, minha filha mais velha, quando com três anos, foi a uma festa de Natal no saguão de lá e quando ela viu chegar o governador, então José Richa, pergunta: mãe é esse o Palhaço Caçu? Ela ouvia eu falar que ia para o Palácio Iguaçu, que trabalhava no Palácio Iguaçú e ela achava que pra eu preferir ficar com essa pessoa mais do que com ela, só poderia ser algum palhaço muito divertido. Poeta, minha filha!
2 comentários:
Ótima esta história do Palhaço Caçu. Criança é tudo de bom.
Pois é, Swain. Em geral são sábias.
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