março 21, 2011





 

 

 

 

 

 

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)

 de Thiago de Mello a Carlos Heitor Cony 


    Artigo I
    Fica decretado que agora vale a verdade.
    agora vale a vida,
    e de mãos dadas,
    marcharemos todos pela vida verdadeira.


   Artigo II
   Fica decretado que todos os dias da semana,
   inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
   têm direito a converter-se em manhãs de domingo.


   Artigo III
   Fica decretado que, a partir deste instante,
   haverá girassóis em todas as janelas,
   que os girassóis terão direito
   a abrir-se dentro da sombra;
   e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
   abertas para o verde onde cresce a esperança.


  Artigo IV
  Fica decretado que o homem
  não precisará nunca mais
  duvidar do homem.
  Que o homem confiará no homem
  como a palmeira confia no vento,
  como o vento confia no ar,
  como o ar confia no campo azul do céu.

  Parágrafo único:
  O homem, confiará no homem
  como um menino confia em outro menino.


  Artigo V
  Fica decretado que os homens
  estão livres do jugo da mentira.
  Nunca mais será preciso usar
  a couraça do silêncio
  nem a armadura de palavras.
  O homem se sentará à mesa
  com seu olhar limpo
  porque a verdade passará a ser servida
  antes da sobremesa.


  Artigo VI
  Fica estabelecida, dez séculos,
  a prática sonhada pelo profeta Isaías,
  e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
  e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.


  Artigo VII
  Por decreto irrevogável fica estabelecido
  o reinado permanente da justiça e da claridade,
  e a alegria será uma bandeira generosa
  para sempre desfraldada na alma do povo.


  Artigo VIII
  Fica decretado que a maior dor
  sempre foi e será sempre
  não poder dar-se amor a quem se ama
  e saber que é a água
  que dá à planta o milagre da flor.


  Artigo IX
  Fica permitido que o pão de cada dia
  tenha no homem o sinal de seu suor.
  Mas que sobretudo tenha
  sempre o quente sabor da ternura.


  Artigo X
  Fica permitido a qualquer pessoa,
  qualquer hora da vida,
  uso do traje branco.


  Artigo XI
  Fica decretado, por definição,
  que o homem é um animal que ama
  e que por isso é belo,
  muito mais belo que a estrela da manhã.


  Artigo XII
  Decreta-se que nada será obrigado
  nem proibido,
  tudo será permitido,
  inclusive brincar com os rinocerontes
  e caminhar pelas tardes
  com uma imensa begônia na lapela.

  Parágrafo único:
  Só uma coisa fica proibida:
  amar sem amor.


  Artigo XIII
  Fica decretado que o dinheiro
  não poderá nunca mais comprar
  o sol das manhãs vindouras.
  Expulso do grande baú do medo,
  o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
  para defender o direito de cantar
  e a festa do dia que chegou.


  Artigo Final.
  Fica proibido o uso da palavra liberdade,
  a qual será suprimida dos dicionários
  e do pântano enganoso das bocas.
  A partir deste instante
  a liberdade será algo vivo e transparente
  como um fogo ou um rio,
  e a sua morada será sempre
  o coração do homem.



  Santiago do Chile, abril de 1964



  tirei do Blog do Zé Beto




 

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Quem sou eu

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Curitiba, Paraná, Brazil
Sou fotógrafa e curiosa. Vivo na cidade de Curitiba e gosto de olhar e documentar a relação das pessoas com os espaços em geral. Levo isso ao pé da letra, quando fotografo as ruas e sua ocupação desordenada. Também nos interiores das submoradias, longe de qualquer padrão de ordem mas com um sentido de segurança, mesmo que penduradas e vulneráveis à primeira chuva. Mas tudo isso tendo como compromisso a beleza, a harmonia. Mesmo na realidade de uma favela, resgatar a dignidade através do belo é o que me interessa. Gosto também, e muito, de design e arquitetura. Da social à contemporânea, o gosto pelo ocupar me interessa. contato: linafaria@yahoo.com.br
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