A noite por aqui foi animada.
Sempre é. Mas quando quero dormir ocupo um quarto mais silencioso.
Essa noite como trabalhei no computador, como sempre,
usei o cômodo de onde da janela observo o cenário da rua.
Começo a entender como flui esse pequeno trecho da cidade, por onde passam
centenas de pessoas todos os dias.
A partir das 7 da manhã, começam a chegar os três pardais com suas necessaires.
Pardal é o morador de rua urbano. Aquele que demarca um espaço, tipo ponto,
e ali passa seus dias bebendo, fumando e tentando tirar um troco de alguém.
Necessarie, porque todo mendigo trás consigo uma sacola.
O mínimo necessário para empurrar a vida.
Vou abrir uma pasta, passado o carnaval, mostrando a dinâmica e ocupação
dessa quadra que não dorme porque cidade não se cansa.
Essa noite, lá pelas 3, comecei a ouvir um uivo.
Pela janela, uma figura de amarelo, de cócoras, com sua sacola ou galo, como chamam
em algumas regiões, a soltar um som com todo o fôlego que seu pulmão conseguia.
Olhei, fotografei, e ele continuou, pelo menos durante uns 40 minutos ininterruptos, seu lamento agudo e interminável.
Uma certa hora, ecoou outro grito, lá longe, em resposta.
Os músicos do prédio acima, foram para o balcão e começaram a uivar também.
Ele não teve a curiosidade que sua seleta plateia da sacada tinha em vê-lo, pois a marquise o escondia deles.
Continuou imóvel na mesma posição, gritando incansavelmente no mesmo tom.
Os músicos que já haviam cansado do mantra e se recolhido, voltaram e formaram com ele um coro de gritos. Isso não o intimidou.
Querendo dele uma mudança de atitude, começaram a aplaudi-lo.
Apaguei a luz e aplaudi-o também.
Os músicos curiosos, ele nem tchum à minha reação.
E assim foi um tempão. Desisti do concerto e nem percebi quando terminou.
Quando fui conferir ele já não estava mais lá.
Pequena trégua e o lugar esta vazio.
Logo mais vem a luz do dia e recomeça tudo de novo,
com a chegada dos três pardais que ali cumprem seu expediente de ócio.
E a cidade segue...
O Zé e o Midas
Há 3 dias
7 comentários:
Essa do pardal a uivar, como dizes, acabou mesmo em mistério, não é?
Fiquei cheio de curiosidade...
E nunca tinhas visto numa ocasião anterior a mesma coisa?
Um beijo.
João, à noite esse lugar é tranquilo. Região boêmia, ouço sempre o som abafado dos músicos, nada que incomode.
Loucos existem aos montes nos centros urbanos.
Essa, seguramente foi a situação que mais me intrigou.
Notam que ele tampa os ouvidos prá não se ouvir?
Mas é disso que vou falar em uma página própria, que descobri ontem como faz, (hehehe), que vou postar esse acompanhamento de como flui essa passarela que só não chega a ser um não lugar, por ter os três pardais que se apropriaram e fruim enquanto é dia.
Tempo e Espaço. Aguarde.
bjs, João.
Fui...
Morei no centro e vivi muitas noites um tanto assim, cheia de sons, muitas vezes misteriosos. Logo que me mudei para um lugar mais calmo, demorava a pegar no sono. Senti falta da cidade que me ninava.
Zaclis, essa urbanidade noturna me interessa.
Vim morar aqui para isso.
Mas o número de demencia tem me assustado na questão social. Não me sinto ameaçada por eles. Sinto que a loucura do crack é muito triste...
E a noite passa...
LINA FARIA
Aguardarei o tempo que seja preciso!
Obrigado pelo teu carinho.
Um beijo.
Tenho acompanhado a cidade da tua janela, Lina. Destaco a maravilhosa frase digitada por ti: "Vou abrir uma pasta, passado o carnaval, mostrando a dinâmica e ocupação
dessa quadra que não dorme porque cidade não se cansa". Demais!
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