Espelho, espelho meu...
Esse é o Alessandro, moço que viveu no muro em frente minha sacada, cujo cotidiano acompanhei à certa distância e respeito. Na semana anterior às eleições, finalmente rendeu-se à pressão da Fas - fundação pública de assistência-, e deixou-se internar.
Um alcólico, como qualquer outro, que perdeu o emprego, a família e a dignidade.
Na rua há meses, havia desenvolvido uma úlcera exposta na perna e no inverno
não conseguia calçar sapatos.
Era a pequena comunidade da rua a segurar anônimamente a onda do "grandão", comprando-lhe
pares de meia a 1 real, no bazar do chinês que comemorava.
Havia até uma conta corrente em seu nome na lanchonete sob meu prédio,
onde ele se aproximava atravessando a rua quando o sol era inclemente no muro onde ficava.
Passava o dia a pedir cigarros, a beber e tentar vender serviços como cuidar de carro,
carregar pacotes, só até ainda manter-se de pé.
Fazia dupla com um baixinho esperto, ardiloso, que ha pouco também sumiu.
Acompanhei, fotografando ou não, quase um ano de embate dos dois pelo não-lugar.
Agora retomou o Cheiroso, senhor de idade que não resistira então à pressão dos dois e nesse quase um ano mudara de quadra.
São longas as noites e os dias desse pedaço de espaço que venho
fotografando e tecendo uma malha urbana
multicolorida, nessa rua da Graciosa que é um não-lugar entre a Matriz e o Poder, desde antanho
e, pelos projetos que se anunciam, será mesmo sempre uma espécie de corredor entre os dois.
Enquanto isso observo e fotografo as ruas e calçadas, esses corredores onde
se percebe o que circula nas veias da cidade que pulsa.
Enquanto isso outro "grandão" ocupa um outro lugar
nesse mesmo espaço.
ah, mas a foto era só para comentar o neologismo
EXTIMIDADE,
de Lacan, que fala da reflexão de nossa própria imagem.
Sobre a síndrome de Narciso em se enchergar invertido.
Em se ver na perspetiva de outro,
fora de sí.
Espelho Magia!
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